segunda-feira, março 16, 2009

Gray cats are collorblind.

"Hoje. Dedico silenciosamente meu último gole de vodka ao cavalheiro escorado com seus dois cotovelos sobre o balcão do bar. Ele não nota e eu jogo a garrafa pelas costas, de modo a cair gentilmente sobre meu calcanhar esquerdo. Dou meia volta e suspiro como se estivesse soltando a fumaça de uma longa tragada. A dor de estomago volta. Sempre volta, depois de quinta feira. Eu nem deveria estar bebendo aquilo. Whatever.
Desde que voltei a morar com meus avós, minha feliz vida de liberdades foi cortada pelos calcanhares. Não completamente reprimida, apenas racionada e limitada aos finais de semana. Uma noite por semana: que grande controvérsia aos 21 anos. Liberdade sobre cadeiras de roda. Meus calcanhares confiscados. Com o tempo você acaba se desprendendo de toda a comodidade familiar, sente-se preso... Aprende a odiar cada segundo ‘cativo’ dentro daquelas paredes que não são suas, sob o teto de madeira e móveis que não condizem com seu gosto. Compensado marfim, flores de plástico enfeitando a mesinha cerejeira no mesmo cômodo. Não. Nada é seu e você abomina isso. Eu aprendi direitinho, preciso sair daqui, preciso fugir das asas maternas, do bolso paterno. As prioridades atiçam a insegurança... E o medo de não conseguir cobrir os próprios gastos está além do meu horizonte – faria eu parte dos índices de desemprego prematuro, sem formação, sem salário? Patético medo. Talvez eu ainda aproveite a comodidade por alguns dias. Mas eu preciso aproveitar estes malditos finais de semana.
O cheiro de fumaça e feromônios abafam minhas narinas antes que eu ao menos inspire. Tudo naquele lugar poderia remeter a um pequeno inferno particular. O dono seria o diabo, o cafetão, o mafioso, rondando com sua cara bonachona por entre seus pupilos banhados pelas luzes vermelhas de entrada de boate barata, alminhas penadas oferecendo seus corpos e economias. Um grande sarau herege – viva à decadência dos valores! – gritam todos. Ninguém se importa com verdades naquele lugar. E eu, estou no meio. Quero um pouco de tudo pra mim, inclusive o cavalheiro escorado no balcão, com seus lábios extenuados e a língua sorvida naquele gosto de cerveja. Quero ele, como se nunca o tivesse visto antes, como uma nova ambição. Soube desde o primeiro beijo, que eu não conseguiria me desprender dele, mas não assim. Mulher do mesmo homem. Quero entrar nesse louvor às sensações humanas, com ele. Hoje.
As pessoas passam por nós como potros cegos, batendo-se, fugindo pelos vãos entre as pessoas, competindo com a música ensurdecedora para travar conversas aleatórias em meio goles de hi-5 com canudinhos coloridos. Todos em suas roupas vintage e adornos de grife que tilintam nos pulsos e pescoços a mostra. Ele estende o braço e cumprimenta ela - pobre garota de coração partido que ele um dia também já possuiu. Sinto meu estômago sendo consumido pela sua própria secreção ácida – Não bebe e não come chocolate - ela me diz. Eu rio deixando claro que sei o que fazer e não fazer, mas agradeço a intenção. Que rosto interessante o dela, algo que não tinha notado da primeira vez. Olhos redondos circulados de azul metálico, boca desenhada. Nunca duvidei do gosto dele. Mantenha estes olhos sob sua guarda - penso eu.
Mulheres solteiras e alteração de índoles causada tanto pelo álcool como pela provocação de algumas situações são suficientes para aflorar o “amor” de qualquer pessoa. Pra nós nunca é diferente. Seres humanos não são movidos pelo cio. Poucos animais têm a dádiva de sentir vontade quando bem entendem, sem seguir um ciclo natural. Sem necessidade de perpetuação. Homens e golfinhos: qualquer hora é hora. Flipper já sentiu orgasmos. Que nojo.
E eu, estou no meio. Primeiro os dois, eu junto. Depois eu... só eu. Sinto-me hipócrita ao atender essas vontades. Ele nunca vai entender o que eu realmente sinto. Os dois juntos de novo. Fico sem graça... as pessoas me olham com pena. Até as mais libertinas conhecem o sentimento de que me refiro. Não é rejeição, e nem sei se existe um nome exato pra isso. Apenas não sou eu lá... sempre. Às vezes é uma outra. O ego de Cleópatra se desvencilha dentro de mim e sinto como se pudesse chorar horrores frente ele, implorando a exclusividade de sentir seus braços e boca sobre a pele quente, minha pele. Mas eu não o faço... pois ele quer e eu o quero como ele é. Reprimi-lo seria a proscrição de sua natureza. Mulheres são tolas ao reprimir seus homens. Continue que a consciência é seu baby. Quando estivermos maduros o suficiente, cortaremos nossa ligação com a grande árvore, perderemos a circulação e começaremos a apodrecer... Tudo à seu tempo e agora vivemos.

Com o tempo o clima se esvai. Eu quero dançar e a quero longe. Só nós dois agora, não existem triângulos perfeitos, quero ela longe - vou ao banheiro, ok? - calma, vou junto, responde. Pobre garota de coração partido, porque fui me importar. Ela precisa de companhia, ok? Not o-k. Mas dançamos, juntos. Apesar de tudo ela é legal, uma amiga em potencial. Dancemos mais um pouco. E propostas desgostosas são lançadas, ele parece não ter notado insatisfação na minha voz, minha moral cai ao chão. Não posso reprimi-lo, mas quando a barreira do som é ultrapassada, as janelas quebram... minha integridade é deixada de lado, minha paciência ruí como as janelas, em milhares de pedacinhos e eu me controlo pra não fazer escândalo, minha cara fechada é cortesia.

Subimos para fugir do ambiente pesado, tento esquecer o inconveniente... De cima tudo é diferente; por cima a sensação é sempre diferente - ignore ou incorpore malícia aqui. As pessoas parecem entrar em uma sincronia mórbida, embaladas por ondas invisíveis e luzinhas efervescente. Uma piscina humana. Uma piscina dentro do limbo. Se não fossem as grades, pularíamos nela, mas só molhamos os pés. Cheiro de cigarros, gosto fermentado, de suor, saliva... O inferno particular é realmente completo. Pergunto-me o motivo de gostar tanto disso. Diversão. Nós aprendemos a ver esse quadro com outros olhos e nos sentimos à vontade vagando dentro dele.

Ele desaparece, quer beber mais um pouco. Ela aproveita a deixa e se delicia, eu, por instinto, a jogo contra a parede e os pervertidos mirins se atem – bando de alienados, vocês não são frutos dessa árvore e nunca vão amadurecer como nós, eu rio uma risada sádica e a minha cabeça percorrer outro lugar para meu corpo poder continuar aquilo. Como sou hipócrita. Penso nele enquanto a consumo. Eu sou desprezível se não estou com ele. Mãos em minha cintura. Uma terceira boca. Viro os olhos e não é ele! Onde ele está afinal?! Tudo para. Nesse exato momento todo o furor da noite, e de vidas passadas emerge do abismo. Condenso minha força num único pensamento de asco coagulado. Isso é demais. Aquele desrespeitoso f.d.p. é demais – Meu sangue sobe a cabeça pra compensar toda a adrenalina liberada. Nesse momento injeto o liquido extasiante em minha mão direita. Assim que eu perco a virgindade: através de meus dedos rijos e fechados contra a palma contraída, acertando lindamente aquele espaço em branco de um rosto estranho, entre os olhos e a altura da boca. Se pudesse rever a cena, ela seria em câmera lenta e o f.d.p. cairia ao chão, grave e contrariado. Mas ele não caiu de verdade. Não deveria ter feito isso... a primeira tragada é sempre a melhor... o primeiro beijo é sempre inesquecível e o primeiro soco é viciante. Não teria dificuldades de acertar alguém novamente. Ela diz que foi lindo mesmo. Talvez eu teria saltado para completar um round, mas o f.d.p. não bateria em uma mulher como eu. Outra risada sádica – uma unha quebrada.

Quero ir embora. Voltar para a luz do nosso éden. Nós dois, vivos e preocupados com nosso bem estar, sem frivolidades. Felizes como crianças... depois de mais uma noite ímpar, como todas as outras."

5 comentários:

Martini disse...

claro que sempre tem o lado feliz e proveitoso das coisas... as melhores, as que nos fazem sentir vivos, loucos, animados... escreveria muito mais sobre elas... apesar de tudo ele me é uma benção... e na tristeza ou na alegria ele me inspira como ninguém...

you know that. Te amo tu, besta

Drug disse...

Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo.... ainda dá tempo?
Dá.
Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo. Te amo.
E eu escreveria muito mais vezes, porém... ai... TE AMO!
Minha companheira, amiga, mulher, amante, bicuda, vida, tudo... e mais um pouco.

Martini disse...

sorry is my words are raw...

te amo, amo, amo, amo Gothik ;)

Vikki disse...

...ainda hei de descobrir o que em você e nos seus textos me é tão instigante...rs

Martini disse...

ah sim, o negócio é tão improvável que é difícil encontrar motivos que sustentem o teu fascínio. ¬_¬

pffff